Buenas, outro mês com tentativa de golpe de Estado no continente. Desta vez, debelado, com a prisão dos militares que fracassaram na Bolívia. Não farei aqui nenhuma análise política que almejasse a compreensão das incongruências do fato. Apenas lembrarei que nas veias abertas do território boliviano há a maior reserva de lítio do planeta, metal utilizado na fabricação de baterias para carros elétricos.
Enquanto isso, em Cuba, o longevo cantautor Silvio Rodríguez elevava mais uma vez sua voz. Lançou um álbum maiúsculo, de sabor tropical e ideias postas ao vento.
Já na Argentina, um sopro fresco de integração, à revelia do vândalo que ora habita a Casa Rosada. Veio de lá o 6º disco do duo Perotá Chingó, formado na deriva continental, com arroubos de paz e amor.
Esta edição é dedicada ao uruguaio Pepe Guerra, integrante do grupo Los Olimareños, que faleceu em meados de junho. Ao lado de Braulio López, esteve na vanguarda nos anos 1960, mesclando a linguagem da música popular com ritmos autóctones menos experimentados, como o candombe.
Também prestamos tributo à tradição latino-americana do cantar com sentido, inaugurada e espraiada por nomes como Violeta Parra.
Avante, LatAm!
O cantautor Silvio Rodríguez endereça seu novo álbum à alteridade. Gravou canções compostas nos últimos anos, muitas delas refletindo sobre a crise cubana, que vem resultando em recorde de emigrações. Começa com sonoridade marcial, em América, saudando os vizinhos que na metonímia expõem seu desejo dominador, .
“La luz me guarde del abrazo de América, de su mirada, de su hechizo de amor. De madrugada se oye el llanto de América, y se parece al dolor" (América, Silvio Rodríguez).
Segue com Viene la cosa, um embalo chistoso, mas sincero, diante de indistinta ameaça, temperado muy bien com percussões e a flauta maravilhosa de Niurka González. Aliás, todo disco é bem arranjado e produzido, com cordas em boa parte das faixas.
Além de protesto, há lirismo e sensibilidade, como em De pronto la tatagua, sobre a mariposa (bruxa) que em Cuba carrega uma lenda de mau agouro. Também na ótima Quería saber, que dá título ao álbum com inquietações de navegador que vacila ao embarcar.
Vale muito escutar o disco todo, e assim presenciar a perseverança da cultura musical latino-americana, matizada pelo cantar opinando.
Da tradição cancionista da gema, passamos à sua reconfiguração contemporânea. O duo Perotá Chingó surgiu do encontro mochileiro das argentinas Julia Ortiz e Dolores Aguirre, quando buscavam conhecer e viver o continente.
Uma década depois, chegam ao álbum Tá, composto de inéditas e da versão luau da clássica It ain't over 'til it's over de Lenny Kravitz. Além do hit, inclui canto ritual, Montecito Sediento, sonoridade flamenca, Ana María, e canção de ninar, Nace una madre.
No primeiro single, Alabanza, com o uruguaio Jorge Drexler, uma levada pop dita com esmero em cada fonema. E na outra participação luxuosa, a colombiana Lido Pimienta agrega seu timbre ancestral à balada dor-de-cotovelo Sencillo.
Um álbum sintonizado com as sonoridades do momento, dentro do espectro da canção autoral, que valoriza e se inspira em diversos dos nossos folclores.
videos y sesiones
Manu Chao tá preparando o lançamento de um disco inédito, depois de 17 anos. O clipe acima vai nos mostrando o que esperar do novo trabalho. A medir por essa canção, mais da sua identificação e engajamento nos anseios latinos, apesar de ser europeu.
Quem acompanha as nossas playlists já topou com alguma canção da colombiana Maria Cristina Plata, inclusive essa Y volviste a decir te amo. Agora, no vídeo acima, será possível conferir sua exímia execução instrumental ao violão, junto ao encantamento que proporciona sua emissão vocal precisa, de timbre grave e envolvente.
Neste Sesiones Monarca, projeto audiovisual criado em 2021 na Colômbia, Gabriela Ponce revela versatilidade. Acompanhada apenas de percussão e baixo, entoa suas canções empunhando o violão, e também improvisa no clarinete. Mostra as faixas de seu ótimo primeiro álbum, El sur del ser, em ambiente familiar e caloroso.
E pra finalizar as recomendações audiovisuais do mês, o genial uruguaio Fernando Cabrera. Com o tino cronista e a sensibilidade aguçada de sempre, cristalizou o assassinato bárbaro do grafiteiro e rapper Felipe Plef. No videoclipe, um réquiem pacifista vela a frustração coletiva ante a injustiça e a escalada do ódio.
Prográmate
Valparaíso | 11, 12 e 13 de julho | Encuentro Nacional de Payadoras | +info
Montevidéu | 13 de julho | Canción de Río | +info
São Paulo | 19 de julho | Sara Hebe | +info
Caracas | 19 de julho | Augusto Bracho | +info
Buenos Aires | 25 de julho | Chabuco | +info
Descubre lo que importa:
[Coolt] El día que cambió el rock latino
[Rolling Stone] El David Aguilar alza la voz y se reinventa
[Pitchfork] Manu Chao Announces First Album in 17 Years
[El País] Así es "Rada, la película", el documental sobre la leyenda musical
[Jornal do Comércio] Clarissa Ferreira insere feminismo e ecologia no gauchismo contemporâneo
A playlist do mês inclui toada andina, chacarera, bolero, tango desconstruído, samba e candombe. Naquela proposta que você leitor(a) já conhece, subindo a temperatura aos poucos. Desde as canções mais profundas e reflexivas, até as mais bailantes.
Além de artistas comentados aqui nesta edição, sonidos que vienen de todas as partes do nosso continente. Destaque para o encontro perfeito entre Katie James e Victoria Sur 🇨🇴, além do super criativo Ricardo Pita 🇪🇨, que está revelando seu próximo álbum.
Não deixe de prestar atenção ainda na super revelação Inés Errandonea 🇺🇾, que também lançou um baita clipe do single Arde. Entre outros, a parceria dos gaúchos Ângelo Franco e Su Paz 🇧🇷 e a buena onda da estreante Eileen Sanchez 🇨🇺.
Que se vengan las canciones
No próximo mês, a dupla peruana Alejandro y María Laura tá lançando um novo álbum, que reúne singles que já marcaram nossas playlists por aqui. Por exemplo, Con la vida al centro, que está na lista desta edição, com participação do dominicano Alex Ferreira.
E lá no fim de julho, sai o primeiro disco do projeto Por Ejemplo Ahora, dos argentinos Ezequiel Borra e Nacho Rodríguez. Até lá, revelam mais uma canção, Sendero, ao lado do brasileiro Moreno Veloso.
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Gracias pela leitura.
¡Hasta pronto!